Notícia

A hora e a vez de uma política de preços para combustíveis


A volatilidade de preços no mercado global de energia tem sido um dos
maiores desafios para os governos de todos os países. As grandes
variações observadas no valor do petróleo, fundamental para a economia
moderna, trazem incertezas para os investidores, pressionam custos e
dificultam a política fiscal. Para enfrentar esse quadro, desde os anos
noventa se experimentaram diferentes caminhos, com relevantes lições.




No Brasil, um marco nesse processo foi a Lei do Petróleo de 1997, a
partir da qual em janeiro de 2002 se completou a abertura do mercado de
combustíveis, com os agentes econômicos definindo competitivamente seus
preços, em função dos custos e margens possíveis, sem a intervenção
governamental e com um novo marco tributário. De fato, uma mudança
significativa, pois durante décadas foi prerrogativa governamental
determinar os preços dos combustíveis, do produtor ao consumidor,
mediante um cipoal de regulamentos e subsídios explícitos ou ocultos,
que no frigir dos ovos trouxeram benefícios para poucos e um enorme
custo para toda a sociedade.




Entretanto, ainda que a abertura do mercado dos combustíveis tenha
sido estabelecida formalmente no Brasil, duas particularidades
dificultam sua efetiva implementação. A primeira é a subordinação da
Petrobras, principal produtor e importador, aos ditames de seu maior
acionista, orientando sua atuação de forma conservadora, de modo a
reduzir os impactos para o consumidor dos movimentos no preço do
petróleo. Assim, ainda que com prejuízo para essa empresa, nos períodos
de alta os consumidores estariam bem atendidos, quadro que se inverte
quando os preços do barril baixam, mas essa redução é represada e não
chega aos consumidores. Tal atuação, sem qualquer transparência de suas
implicações, sinaliza mal os custos, orienta equivocadamente o mercado
e a rigor configura um desrespeito à legislação: vender por preços
abaixo do custo é dumping e vender acima dos preços de mercado é
igualmente pernicioso e sinal da existência de barreiras de mercado a
serem eliminadas.




Em outras palavras, ao manter artificialmente baixos os preços dos
combustíveis, não se promove o uso racional da energia e se penaliza os
agentes privados, como aliás ocorreu com fechamento das pequenas
refinarias brasileiras nos últimos anos.




No contexto atual, onde os preços externos são inferiores, cabe
perguntar: se a lei faculta a importação, por exemplo, de óleo diesel,
por agentes devidamente habilitados, por que os consumidores
brasileiros, principalmente os grandes consumidores, não importam
diretamente a preços mais baratos?




A outra dificuldade para a implementação de um mercado de
combustíveis mais aberto é a rigidez do marco tributário, que impede o
poder público atuar de modo adequado para atenuar impactos e atender
legítimas estratégias de governo, como a proteção dos consumidores de
menor renda e o estímulo aos combustíveis renováveis, no âmbito de uma
política energética saudável.




A redução oportunista e episódica dos tributos dos combustíveis,
como observada no Brasil e na maioria dos países nos últimos anos, leva
sempre a preços distorcidos e agentes abusando de posições
predominantes, com prejuízos para a maioria.




É possível e necessário se estabelecer um melhor ambiente para os
preços dos combustíveis no Brasil, com transparência e eficiência. O
ponto de partida é a necessidade de reduzir o efeito da inescapável
volatilidade dos preços internacionais do petróleo, mantendo os
fundamentos de um mercado aberto, onde os agentes conheçam os custos e
saibam como são e podem ser formados os preços, independentemente da
vontade do governo.




Nessa direção, o Chile apresenta um exemplo exitoso, adotando desde
2005 um imposto para os combustíveis com uma parte fixa e outra
variável, ajustada periodicamente de forma a compensar as variações dos
preços internacionais e permitindo que o preço varie em uma faixa de
10% em torno do custo médio de paridade, referido ao petróleo. No caso
do país andino, esse tributo está associado ao Fundo de Estabilização
dos Preços dos Combustíveis, cujo montante sinaliza as tendências de
alta ou baixa, sendo os valores dos custos de paridade (ou de
oportunidade) divulgados semanalmente pelo governo.




Em nosso país, quando se introduziu em 2001 o atual modelo
tributário para os combustíveis, se pretendia que a Contribuição de
Intervenção no Domínio Econômico (Cide) fosse periodicamente ajustada
de modo a amortecer as variações dos preços internacionais. Ficou
faltando, contudo, a definição das formas de ajuste.




Estabelecendo tais regras de modo transparente e previsível, esse
modelo pode ser aperfeiçoado, incluindo os biocombustíveis e uma
política diferenciada para o gás liquefeito de petróleo (GLP),
consolidando as diversas emendas posteriores e recuperando sua
importância.




Um marco tributário desse formato, coerente com a política
energética, que atenda ao equilíbrio fiscal e respeite o consumidor, é
realmente urgente.



Fonte: Valor Econômico
Data: 12/05/2009