Lei do Gás: acertos e desafios
Depois de vários anos de discussões, foi aprovada no Congresso e
sancionada pelo presidente em 4 de março de 2009 a lei n 11.909,
popular-mente conhecida como Lei do Gás. Essa lei, que dispõe
principalmente sobre o transporte e a comercialização de gás natural no
país, ainda se encontra em fase de regulamentação, mas a expectativa
existente de que ela seja a solução dos problemas da indústria e o
fator crítico para a ocorrência de novos investimentos no setor pode
estar longe da realidade.
Hoje, no Brasil, todos os gasodutos de transporte existentes foram
construídos por meio autorizações e são controlados pela Petrobras (com
a exceção de um único gasoduto em Mato Grosso).
A principal novidade da Lei do Gás é criar o regime de concessão,
precedida de licitação, para os novos gasodutos de transporte que
venham a ser construídos no país (exceção de projetos já iniciados que
ainda poderão ficar sob o regime de autorização).
Filosoficamente, é difícil ser contra a idéia, mas a estruturação de um
projeto na forma prevista na lei traz grandes dificuldades, dada a
quantidade de minúcias de diferentes naturezas que precisam ser
resolvidas entre os envolvidos. Como diz a sabedoria popular, o diabo
mora nos detalhes. E como fazer com que eles sejam previamente
discutidos e sanados entre futuros
contratantes e contratados de um processo licitatório e não levem o projeto à inviabilidade?
Indubitavelmente, a Lei do Gás trouxe importantes avanços ao tratar e
normati-zar vários temas delicados e polêmicos. O tempo de
exclusividade dos carregadores originais (as empresas que vierem a
comprar a capacidade inicial de transporte dos gasodutos), as regras
para obrigar os transportadores a permitirem o aumento de capacidade
dos gasodutos existentes e disciplinarem o seu acesso e também as
formas de contratação e prioridade existente entre elas são notadamente
pontos altamente positivos e necessários.
A nova lei é bastante rígida e detalhada em termos de obrigações,
deveres e responsabilidades do transportador com previsão de punições
pelo descumprimento das regras contratuais. No entanto, não se observa
o mesmo rigor com relação aos seus direitos e necessidades, e alguns
aspectos fundamentais nessa vertente ainda precisam ser mais bem
trabalhados.
O primeiro deles é a garantia de pagamento do transportador. Segundo a
lei, o projeto do gasoduto será baseado em demandas estabelecidas por
meio de 'termos de compromisso' dos carregadores protocolados na ANP.
As perguntas que ficam ainda sem respostas são as seguintes: Já que ele
estará comprando uma capacidade de transpor-
te, qual a qualidade do crédito desse carregador? Quais as garantias
oferecidas por ele? Serão elas suficientes para que alguma instituição
aceite financiar o projeto?
Uma segunda incerteza, também com impactos na questão anterior, é a
seguinte: o que acontece caso um ou mais carregadores não honre o
'termo de compromisso'? O gasoduto terá que ser redimensionado e ser
recalculada a tarifa de transporte (que certamente irá ficar mais cara)
ou isso será um risco adicional do transportador?
Essa pergunta não é apenas um exercício teórico. No início da década
passada, quando houve um processo semelhante para levantar novos
interessados em transportar gás no gasoduto Brasil-Bolívia, várias
empresas se cadastraram. Para o atendimento de todas as solicitações
protocoladas, a capacidade do gasoduto teria que ser mais do que
duplicada. Posteriormente, na hora de assumir compromissos, os
interessados desapareceram e não houve sequer um carregador adicional.
Esses são apenas alguns exemplos para ilustrar as dificuldades que
terão que ser vencidas para criar a figura do transportador
independente por meio de concessões e da forma prevista na lei. Que
venha a regulamentação...