Notícia

O Brasil na contramão do mundo

O comissário de Energia da União Europeia (UE), Guenther Oettinger,
propôs ontem uma suspensão temporária de novos projetos de exploração
de petróleo e gás em águas profundas nos mares do Norte, Negro e
Mediterrâneo.



A recomendação segue a proibição determinada pelo governo dos
Estados Unidos, em resposta ao vazamento iniciado em 20 de abril no
poço do Golfo do México, operado pela BP. O desastre ambiental já é
considerado o maior da indústria petrolífera mundial. Na contramão, o
Brasil acelera seus projetos em águas profundas.




— A indústria deve testar três vezes suas práticas, programas de
treinamento e tecnologias. As empresas precisarão convencer os órgãos
reguladores de que fizeram as verificações necessárias e reforçaram a
segurança — disse Oettinger após encontro com representantes de 22
companhias petrolíferas em Bruxelas.




A Noruega, maior produtor europeu e que não integra o bloco da UE,
também proibiu a exploração em águas profundas no Mar do Norte.




A suspensão proposta pelo comissário da UE vigoraria enquanto os
órgãos reguladores americanos e europeus examinam o que causou o
acidente da BP. A decisão, porém, cabe a cada um dos 27 Estados do
bloco.




Já o comissário de Meio Ambiente da UE, Janez Potocnik, reconheceu
que uma análise das regras ambientais do bloco revelou falhas.




— Parece que temos duas opções: ou aplicamos instrumentos
específicos (para a perfuração offshore) ou ampliamos o escopo de
nossas ferramentas já existentes — disse.




Enquanto o mundo aperta o cerco às petroleiras, o Brasil inicia
hoje oficialmente a produção de petróleo no pré-sal do Campo de Baleia
Franca, no sul do Espírito Santo. As reservas foram descobertas em
dezembro de 2008. Segundo a Petrobras, o poço produzirá 13 mil barris
de petróleo leve por dia e a previsão é que atinja a capacidade máxima
de 20 mil barris/dia, ainda este ano.





Analistas divergem sobre suspensão




A proposta de paralisação temporária da exploração em águas
profundas provoca divergência entre os especialistas no Brasil. Há
cerca de 15 dias, problemas operacionais durante a perfuração do
segundo poço no pré-sal, na Bacia de Santos, levaram a seu fechamento.




O professor do Instituto de Economia da UFRJ Hélder Queiroz
criticou a falta de mais informações sobre as regras de segurança por
parte da Agência Nacional do Petróleo (ANP) e do Ministério de Minas e
Energia.




— A ANP precisa mostrar à sociedade o que temos, e se vai ser
preciso mudar algo ou não. E se for, quais medidas serão necessárias
para reforçar — disse Queiroz.




Já a procuradora federal Telma Malheiros, responsável pela criação
do escritório de licenciamento das atividades de petróleo e nuclear do
Ibama — atual Coordenação de Petróleo e Gás do instituto —, defende que
o Brasil altere seu modelo de gestão das bacias petrolíferas, de modo a
incorporar a avaliação ambiental dessas bacias.




— O Brasil não deveria autorizar novos projetos de exploração em
águas profundas enquanto não tiver uma avaliação estratégica ambiental
de suas bacias. Só assim teremos um mapeamento com áreas onde a
atividade petrolífera não pode ser conduzida pelo elevado risco que um
vazamento poderia provocar. E essa exigência deve ser imposta pelo
governo.




Já Edmar de Almeida, do Grupo de Energia do Instituto de Economia
da UFRJ, reconhece que houve falhas graves da BP, mas afirma que o
Brasil deve manter seu programa no pré-sal.




— Risco sempre tem. Mas uma moratória é uma resposta política à
pressão popular. Além disso, a produção nas bacias brasileiras não está
caindo como na Europa. Estamos apenas no início da festa. Portanto, o
Brasil não tem que entrar nessa onda. O que deve ser feito é investir
em tecnologia para mitigar riscos — afirmou.




O diretor-geral da ANP, Haroldo Lima, garantiu que as normas de
segurança adotadas no Brasil estão entre as melhores do mundo e não vê
motivos para a suspensão de futuros projetos em águas profundas no
país.




— A nossa legislação de segurança operacional é considerada uma das
mais modernas do mundo. Soubemos dessa notícia pela imprensa (suspensão
em outros países) e, por enquanto, não temos a intenção de adotar
medida semelhante — afirmou Lima, completando que o acidente da BP
ajudará a aperfeiçoar a legislação.






Radicalmente contrário à exploração do pré-sal, o diretor de
campanhas do Greenpeace, Sergio Leitão, frisa que o Brasil vai na
contramão dos esforços mundiais para reduzir as emissões de CO2. Para
ele, os bilhões que serão investidos no pré-sal deveriam ser aplicados
em pesquisas para desenvolver energias alternativas.

Na Bolsa de Nova York, as ações da BP fecharam em queda de 1,90% ontem.




Fonte: O Globo
Data: 16/07/2010